MPC/RR encerra III Congresso com valorização dos povos originários e palestras de Davi Kopenawa e Roberto Cabrini
Postado
24/11/2024 12H05
Um documento com o conteúdo do que foi discutido durante o evento, será entregue às autoridades políticas do Estado / Foto: Marcelo Mora /
O encerramento do III Congresso MPC/RR - Povos Originários e Direitos Humanos reuniu debates sobre o diálogo das comunidades indígenas e órgãos governamentais, jornalismo investigativo, antropologia, direito humanos e a entrega da Medalha Cruviana de 'Honra ao Mérito' e 'Gestão Fiscal'.
A palestra inicial da tarde foi ministrada pela Presidenta da Fundação Nacional dos Povos Indígenas, Joênia Wapichana, destacando a importância do fortalecimento de parceria com as comunidades para o desenvolvimento de educação, pesquisa, segurança alimentar, incentivo ao empreendedorismo, tecnologia, proteção ambiental e saúde.
"A questão indígena não é só um foco, ela é transversal. É uma questão não ideológica, mas de respeito à vida, de direitos humanos e de inclusão. As pessoas precisam entender que os povos indígenas fazem parte da sociedade brasileira, tem seus conhecimentos tradicionais que podem muito bem contribuir com as demandas do próprio Estado", destacou Joênia.
Roberto Cabrini destaca o papel do jornalismo investigativo na justiça social
Em sua palestra no III Congresso MPC/RR - Povos Originários e Direitos Humanos, o jornalista Roberto Cabrini ressaltou a importância do jornalismo investigativo como instrumento de transformação social e defesa dos direitos humanos. O profissional da comunicação destacou a necessidade de comprometimento ético e aprofundamento por parte da imprensa.
Para Cabrini, o jornalismo deve cumprir sua função social ao amplificar as vozes dos que mais precisam. "O jornalismo que não dá voz àqueles que não possuem voz é um jornalismo que não cumpre a sua função social. Todos os dias nós precisamos batalhar por isso", pontuou, reforçando o papel da mídia como defensora dos direitos fundamentais.
O jornalista também destacou a relação entre a preservação das culturas e a documentação das realidades dos povos originários. "A preservação das culturas. Os povos têm direito à sua autodeterminação, à sobrevivência dos seus costumes, das suas verdades. O jornalismo tem uma função vital quando ele retrata a realidade da forma mais fiel possível. Não é nossa função tomar decisão. A nossa função é ser a janela da realidade. Para que a sociedade, bem documentada e nutrida de informações bem apuradas, possa tomar as melhores decisões", completou.
Cabrini incentivou os acadêmicos de Jornalismo presentes a exercerem seu papel com coragem e compromisso, enfrentando preconceitos e acreditando no potencial da profissão como ferramenta de justiça social. "É preciso coragem, vencer preconceitos e acreditar no nosso sonho, de que o jornalismo pode ser uma das ferramentas mais eficazes de justiça social", concluiu.
O promotor de Justiça do Ministério Público do Estado, Márcio Rosa, ministrou em seguida a palestra sobre “Antropologia e Direitos Humanos” e como os costumes dos povos originários influenciam inclusive o sistema de justiça aplicado nas comunidades, reforçando a necessidade que os órgãos públicos compreendam esse formato característico na hora de tomar decisões e criar políticas públicas.
“As pessoas enxergam o mundo por um monóculo e acham que aquilo que veem é toda a verdade. E que todos os outros devem estar de acordo. Não entendem que há uma pluralidade de visões de mundo, de sociedades distintas que produzem inclusive um direito distinto. Os povos indígenas também fazem o seu direito, tem as suas formas de resolução de conflitos, os seus regramentos, os seus regimentos", pontuou o promotor.
Davi Kopenawa critica impactos do garimpo ilegal e andamento da PEC nº 48
O líder indígena Yanomami Davi Kopenawa, uma autoridade conceituada internacionalmente, também fez presença no III Congresso MPC/RR - Povos Originários e Direitos Humanos. Na palestra de encerramento do evento, o xamã e presidente da Hutukara Associação Yanomami abordou a exploração do território e a luta pela sobrevivência dos povos indígenas.
"Invasores estão cada vez mais aumentando os números e destroem a nossa grande alma da floresta, junto com nós. Eu sou contra as máquinas pesadas. A mineração destroi o nosso lugar, onde a gente mora, estragando os rios e matando milhares de animais. A floresta está morrendo", pontuou, fazendo uma crítica aos impactos do garimpo ilegal em Roraima.
Kopenawa também se pronunciou contrariamente à proposta de emenda constitucional nº 48, do Marco Temporal. O líder indígena afirmou que não está triste, mas revoltado com a proposta.
"Todo mundo sabe que o Marco Temporal não é bom. Estão roubando a terra do povo originário, quem cuidou primeiro. Milhares e milhares de anos o povo yanomami está cuidando. Não é só hoje. E europeu veio de longe, atravessando o mar, para dizer que ele descobriu. Ele não descobriu, eles vieram para visitar a nossa floresta amazônica, são recentes invasores. Yanomami já cuida há muitos anos. Ama a floresta, a terra, a água, saúde, sabedoria, então isso continuar acontecendo é muito ruim", declarou.
O Procurador-Geral do MPC/RR, Paulo Sérgio Oliveira de Sousa, agradeceu a presença de todos e informou que a quarta edição do Congresso já está confirmada para 2025. Ainda, que fará uma publicação dos conteúdos apresentados durante as palestras para entrega às autoridades políticas do Estado.
Sugeriu ainda a composição de uma comissão de estudo entre órgãos públicos estaduais e federais, não só de Roraima, que possam contribuir para elaboração de políticas públicas na área da proteção dos povos originários, do meio ambiente e defesa dos direitos humanos.
“O Congresso nasceu pela inquietação que nós tivemos, de ver o sofrimento do povo Yanomami. A causa não é só uma responsabilidade da Funai. A responsabilidade é nossa. O quarto Congresso vai acontecer, vamos continuar discutindo, debatendo, criando novas propostas e recebendo sugestões. Vamos produzir o conteúdo do Congresso com as proposições e encaminhar aos deputados e senadores federais. É um espaço de grito. Acredito que o objetivo que queríamos alcançar foi alcançado”, finalizou.
A solenidade foi encerrada com entrega da Medalha Cruviana para autoridades que promoveram trabalhos de relevância para a sociedade, na área de “Honra ao Mérito Institucional” e “Gestão Fiscal”. Após a entrega das medalhas, a solenidade se encerrou com um pocket show do cantor Neuber Uchôa.
LUAN GUILHERME CORREIA
Categoria:Política